O anúncio do pacote contra a corrupção feito pela presidente
Dilma Rousseff no meio da semana é mais uma tentativa de afastar o problema da
esfera política, mas sociólogos e cientistas políticos analisam que a questão é
mais profunda. Além da formação da sociedade brasileira, a competitividade
existente em diferentes âmbitos ampliam os riscos para a prática de atos
corruptos, transformando a questão em algo inerente ao ser humano e exigindo
reflexões mais amplas sobre como é possível mudar esse cenário.
Em cerimônia no Planalto, a presidente Dilma Rousseff
apresentou os detalhes de um pacote enviado ao Congresso Nacional para tentar
combater o problema da impunidade contra crimes de corrupção.
As principais medidas estabelecem a criminalização da
prática de caixa dois; aplicação da Lei da Ficha Limpa para todos os cargos de
confiança no Governo Federal; alienação antecipada dos bens apreendidos após
atos de corrupção; responsabilização criminal de agentes públicos que não
comprovarem a obtenção dos bens; e confisco de bens dos servidores públicos que
tiverem enriquecimento incompatível com os ganhos.
No entanto, o cientista político Ernani Carvalho, da
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), afirmou ser possível reduzir o
problema da corrupção, mas é impossível acabar por ser inerente ao ser humano.
"É uma questão de tirar o melhor proveito de uma
situação. Muitas vezes, por não estar saciado com o que tem, o ser humano vai
buscar meios ilícitos para alcançar seus objetivos, seja recursos financeiros
ou outros objetivos", frisou.
Ernani Carvalho alertou também para a existência de um
cinismo social quanto à corrupção. "Há um grau de cinismo social, mas o
comportamento deles no dia a dia, furando filas, passando na faixa de pedestre,
também é um erro de conduta", analisou.
Potencial
A competitividade presente na sociedade amplia o potencial
de corrupção, segundo o cientista político Jorge Almeida, da Universidade
Federal da Bahia (UFBA), transformando o problema como algo global.
"Em qualquer sociedade competitiva onde exista
dificuldade para se obter determinados recursos, há sempre o potencial de
corrupção. Não é só uma característica ibérica porque existem casos em todo
mundo. Evidentemente que dependendo de como o Estado e a sociedade agem contra
isso faz com que quem pratique tenha até vergonha, levando alguns até ao
suicídio", explicou o professor.
O sociólogo Antônio Flávio Testa, da Universidade de
Brasília (UnB), apontou para como a corrupção é reproduzida em diferentes
setores, atingindo da máquina pública às famílias.
"Se você olhar pesquisas, vamos detectar que há no
comportamento brasileiro cada vez mais crescente de burlar regras. Isso é
cultural e cresce cada vez mais. É aí que está o problema, porque a corrupção
do Estado é estrutural, a corrupção é reproduzida nas famílias, nas escolas. A
política é corrupta. Os legisladores fazem leis com interpretações
abertas", pontuou.
Antônio Flávio Testa acredita que a solução para o problema
é maior também do que o simples investimento na formação cidadã, apesar de
destacar ser preciso fazer um trabalho rígido desde a criança até o adulto.
"O problema é mais profundo do que investir em cidadania. A questão está
na formação do brasileiro. Tem que fazer um trabalho desde a criança até o
adulto, com regras rígidas", avaliou.
Difícil
Para o professor da UnB, é muito difícil mudar essa
realidade e alertou para que não se confunda uma sociedade potencialmente
corrupta com desonesta. "Acredito que é uma situação muito difícil de ser
mudada. Agora não se deve confundir com honestidade. Isso é um paradoxo. Em
linhas gerais, as pessoas ficam indignadas com a roubalheira, com casos de
corrupção, porque são honestas, mas quando acontecem com os mais próximos fazem
vista grossa", defendeu Antônio Flávio Testa.
O sociólogo William Vella Nozaki, professor da Fundação
Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), ressaltou também que o
processo de formação da sociedade brasileira resultou numa população que ainda
confunde as diferenças entre a esfera pública e o que significa a esfera
privada.
Questionado sobre como é possível alterar essa realidade,
William Nozaki disse acreditar que esta pergunta esteja sendo feita pela
presidente Dilma Rousseff. "É um problema estrutural. Se não se amplia a
cidadania, não tem como solucionar. O jeito é ampliar os canais de diálogo.
Deve haver uma frente ampla de ações", disse o docente.
O cientista Jorge Almeida frisou que a média alta de casos
de corrupção em cargos de direção do Estado prejudica qualquer mudança de
pensamento em relação à questão. "Aqueles que estão na direção do Estado
tem a obrigação maior de dar o exemplo. Se as pessoas veem que pessoas que
estão no poder fazem, as pessoas acham que tem o direito de também fazer",
explicou.
Já Ernani Carvalho, da UFPE, ressaltou que a solução do
problema passará somente pela forma como a sociedade se posicionará diante da
corrupção.
Alan Barros
Repórter
Folha Serrana, um site criado para mostrar os fatos e cultura dos Bastiões/Iracema e toda a região jaguaribana...
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