Há quase
três anos, Júlia Pinheiro das Chagas, de 31 anos, foi resgatada pela polícia na
comunidade Lago dos Paus, no Rio Gregório (AM). Atualmente ela mora em uma casa
alugada com seis filhos, frutos de uma relação incestuosa que manteve por anos
com o seu pai, João das Chagas Ribeiro Mourão, de 66 anos. Há dois, ele cumpre
a sentença no regime fechado no presídio Manoel Neri, em Cruzeiro do Sul,
distante 648 quilômetros da capital acreana. As marcas do passado ainda fazem
Júlia chorar.
A dona de
casa conta que vive com a ajuda de Aluguel Social, oferecido pela prefeitura da
cidade, que abriga ela e os seis filhos. Tímida e com o vocabulário restrito,
Júlia relembra a vida que tinha ao lado do pai. “Eu engravidei oito vezes, mas
os dois mais velhos morreram. Eu não sabia que era errado, não entendia nada
disso. Só percebi que tinha algum problema quando meus filhos começaram a ter
deficiência, sabia que eles não eram normais”, conta.Das seis crianças, a que
apresenta o estado mais crítico é o filho de 6 anos. Ele não anda devido à uma
deficiência motora e também apresenta uma espécie de descamação na pele. Outra
filha, uma garotinha de 11 anos, também apresenta dificuldades de
relacionamento.
Têm dias que
a minha filha passa o dia sem comer, não fala com a gente. Fica pelos cantos,
acho que ela tem uma lembrança bem forte de tudo que aconteceu”. Durante a
entrevista, a menina não chega a comentar nada. Após conversa com a mãe, ela
confessa que não gosta de ir nem mesmo à escola por conta das muitas pessoas
que têm que enfrentar. Sobre as lembranças do que viveu com seu pai/avô, ela
prefere o silêncio.
Questionada
se um dia pretende reencontrar o pai, Júlia diz que tenta aos poucos perdoar o
que João fez com ela e com as crianças. “Eu penso em procurá-lo para que ele
possa ver as crianças, porque quando ele foi preso, nossos filhos eram todos
bem pequenos. Tive muita raiva dele, mas agora estou tentando esquecer. Posso
até perdoar, porque quem quer o perdão, perdoa. Mas, às vezes que é difícil
falar”, diz emocionada.
A dona de
casa relembra que quando vivia com o pai não tinha contato com ninguém, pois
João a fazia guardar segredo sobre a vida a dois. “Eu não ia à cidade e ele
pedia muito que eu não contasse para ninguém que ele era meu pai”, conta.
Ao G1, a
mulher diz que tenta não conversar com os filhos sobre o que aconteceu e
acredita que os meninos não sintam saudades do pai que, segundo ela, batia
tanto em Júlia como nas crianças. No dia do resgate, em 2012, ela recorda
nitidamente como a polícia chegou.
“A gente
estava cuidando da farinha e eu estava dentro de casa porque ele tinha acabado
de me bater, ele batia muito a minha cabeça na parede da casa”, alega. Ao lado
dos seis filhos, Júlia não contém as lágrimas ao ver a foto do pai dentro da
cadeia. À reportagem, ela diz que o choro é de raiva e mágoa de tudo o que
aconteceu, mas ela repete entre lágrimas que perdoaria João.
Desde o
acontecido, Júlia diz que não tem mais contato com a mãe e nem sabe se ela está
viva. Segundo ela, a mulher mora em uma comunidade às margens do Rio Tarauacá.
O G1 também
tentou encontrar informações sobre a mãe de Júlia, mas foi informado pela
Delegacia da Mulher, que presidiu o inquérito que o endereço da mãe de Júlia
está registrado como indeterminado.
Ela não é
minha filha’
Aos 66 anos,
João está há quase 3 dentro do presídio. Durante este período, nenhuma visita
ao acusado foi registrada. Por meio de uma autorização da justiça, o G1 entrou
no presídio Manoel Neri e ouviu a versão do produtor rural que viveu com a
filha entre os anos de 2002 a 2012. Em sua defesa, ele afirma que Júlia não é
sua filha de sangue. No entanto, não pediu exame de DNA para provar o que diz.
Na certidão de nascimento de Júlia, não há informações sobre a mãe, apenas
dados de João. “Eu nasci e me criei na mata, não sabia o que era crime e nem
justiça. Eu só vi que tinha errado depois que a polícia bateu nas minhas terras
e agora pago pelos meus erros. Mas, ela não é minha filha de sangue, eu que
criei, mas a mãe dela me disse que o pai da Júlia é um homem que mora em outra
cidade”, defende-se.
Mesmo com a
alegação, ele diz que não há documentos que provem que não existe essa ligação
sanguínea. Ele apenas confia na palavra da mulher em que era casado. Sobre as
agressões contra os filhos e Júlia, ele nega. “Esse crime eu não tenho. Quero
que Deus mande um castigo para as minhas mãos caírem se algum dia eu bati em
uma daquelas crianças ou nela”, diz.
Hoje,
cumprindo uma sentença de 22 anos de prisão, João se diz arrependido. “Já
chorei, chorei mesmo. Queria ver meus filhos. Desde que fui preso, não tive
nenhum contato com eles”, desabafa. Informações G1
postado por Folha Serrana
Folha Serrana, um site criado para mostrar os fatos e cultura dos Bastiões/Iracema e toda a região jaguaribana...
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